Dizem que, lá pelos idos de 1970, quando o conjunto musical O Grupo iniciava sua carreira de sucessos pelas bandas do interior, Pedro, Chico e Mico foram à Capital comprar alguns equipamentos novos. A viagem foi feita em uma Kombi zerinho em folha, recém saída da agência, que serviria para transportar tanto os instrumentos quanto os músicos — e eventualmente, alguma caixa de bergamotas.
Em Porto Alegre, deixaram o Mico no centro, mais precisamente embaixo do viaduto da Borges, com a promessa solene de que, lá pelas cinco da tarde, voltariam para buscá-lo no mesmo ponto. E lá ficou o Mico, com sua inseparável caixa de ferramentas e a cara de quem não sabia se estava numa missão musical ou largado à própria sorte.
Na hora combinada, nada da Kombi. Os minutos foram virando horas, e o Mico, já inquieto, começou a olhar para os lados como quem espera um milagre de para-choque e alma. A cada buzina, dava um pulo. A cada Kombi branca, um suspiro frustrado. Como a demora virou angústia, e com medo de ter ficado para trás e perder a carona de volta a Portela, ele se aproximou de um guarda que já estava ali fazia um bom tempo — quase tão imóvel quanto o poste — e perguntou com toda a diplomacia de um desesperado:
— Seu polícia, o senhor que está aqui há mais tempo que eu... por acaso não viu passar uma Kombi branca, sem placa, lá de Portela, com o Pedro Alíbio e o Chico dentro?
O guarda franziu a testa, ensaiando uma resposta para aquela descrição que mais parecia senha de jogo do bicho, quando — por milagre ou por remorso — a Kombi encostou no meio-fio bem ao lado. O Mico mal teve tempo de agradecer o guarda com um aceno atrapalhado, já jogando a caixa de ferramentas pra dentro e embarcando como quem escapa de um naufrágio.
Dizem que o guarda, até hoje, fica ali de plantão, esperando entender o que foi aquilo.