Seu Vitório era uma lenda. Suas histórias ultrapassaram o tempo e continuam vivas na pequena cidade onde ele trabalhava na prefeitura. Era um homem respeitado, especialmente pelos moradores humildes e de pouca instrução que viviam nas lavouras do interior. Talvez por causa de sua autoridade, suas histórias – sempre recheadas de exageros – raramente eram contestadas, pelo menos não na sua frente.
Entre as tantas aventuras do seu Vitório, há uma que teria ocorrido no final dos anos 50. Na época, chegou um grupo de técnicos da Capital para realizar medições de terras e traçar o caminho de novas estradas. Após se apresentarem ao prefeito e exibirem as credenciais (que, na verdade, nem eram necessárias – o carro oficial já impunha respeito), foram apresentados ao seu Vitório. O prefeito o designou para acompanhar e ajudar os visitantes no que fosse preciso.
Durante as visitas às propriedades que estavam sendo demarcadas, seu Vitório, como de costume, aproveitava para contar suas histórias. E, claro, exagerava aqui e ali, especialmente nas que envolviam caçadas. Os técnicos, entre a dúvida e o encanto, ficaram impressionados com os relatos do anfitrião. Tanto que decidiram convidá-lo para uma caçada. Afinal, a região ainda era praticamente toda coberta de mato, e a caça era farta.
Seguiram para os lados de Derrubadas, perto da recém-criada reserva florestal do Turvo. Acamparam, e na manhã seguinte os três porto-alegrenses, querendo testar a coragem do "caçador lendário", pediram que Vitório fosse sozinho buscar alguma caça para o almoço. Eles preferiram ficar descansando no acampamento e, à tarde, prometeram acompanhá-lo.
Meio contrariado, mas querendo manter a fama, seu Vitório entrou na mata. Não havia se passado nem quarenta minutos quando os rapazes ouviram uma barulheira tremenda: galhos quebrando e um som de algo pesado se movendo rapidamente. Ficaram apavorados, mas logo viram que era Vitório saindo da mata – correndo como um desesperado! Só estranharam o fato de ele passar reto pelo acampamento.
Foi então que avistaram, a uns 30 metros atrás dele, uma onça enorme vindo na mesma direção! Assustados, não sabiam o que fazer. Mas, em meio ao desespero, ouviram nitidamente o grito de Vitório, aos berros, enquanto corria:
– Pessoal, depressa! Peguem esta que eu vou voltar buscar mais uma!