Ser jornalista e escritor sempre foi um dos meus grandes sonhos. Imaginava-me escrevendo textos, publicando crônicas e poesias, e tendo um público que interagia com o que eu produzia. Afinal, eu era apenas um guri iniciante, recém-ingresso na Famecos, na PUC. Trazia dos tempos de casa de estudante e do segundo grau um conjunto de paixões juvenis retratadas em livros e letras.
Havia lido e relido livros como 20 Poemas de Amor e Uma Canção Desesperada, de Pablo Neruda, e coletâneas de poesias e poemas de Vinicius de Moraes. Como talvez toda a minha geração, viajara e delirara com o surrealismo latino-americano de Mario Vargas Llosa. Encantava-me também com a crítica política de As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano. Tinha mergulhado nos escritos de Carlos Castaneda, com sua A Erva do Diabo, e viajado pelo universo fantasmagórico de Juan Rulfo em Pedro Páramo. Lia também Planalto em Chamas.
A literatura brasileira era igualmente marcante para mim. Lia Graciliano Ramos e adorava Memórias do Cárcere e Vidas Secas. Jorge Amado, com suas histórias em Terras do Sem-Fim, também ocupava um espaço especial no meu imaginário. Ainda lembro como Quincas Berro D’Água me impressionou profundamente.
Outros autores apareciam aqui e ali, nas crônicas espalhadas pelo caderno de sábado do Correio do Povo. Luis Fernando Verissimo foi uma descoberta marcante; lembro do impacto de O Popular, que me fez acompanhar seu trabalho literário por anos. Passei boa parte da vida tentando identificar o "popular" que ele descrevia, mas parecia que, assim que o encontrava, ele deixava de ser "popular". Esses escritores e tantos outros influenciaram minha formação até os 20 anos.
Naquele tempo, os bares e botequins eram paradas obrigatórias para estudantes discutirem os destinos do mundo e da vida. Entre uma cerveja e outra, declamávamos poemas. Quando os papos literários ou as lembranças das paixões impossíveis vinham à tona, eu recitava o Soneto da Fidelidade, de Vinicius de Moraes:
"De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento..."
Ou os versos de Neruda:
"En las noches como ésta la tuve entre mis brazos.
La besé tantas veces bajo el cielo infinito.
Ella me quiso, a veces yo también la quería.
Cómo no haber amado sus grandes ojos fijos.
Puedo escribir los versos más tristes esta noche..."
-Bons tempos!
Além da literatura, a música também permeava esses momentos. Nesses bares, ouvíamos Raul Seixas, Belchior, Gonzaguinha, Geraldo Vandré, Milton, Chico Buarque e tantos outros. Às vezes, havia até quem tocasse ali mesmo.
Eu tinha 20 anos e havia ingressado recentemente na faculdade de Jornalismo — ou, para ser mais preciso, no curso de Comunicação Social, embora o "chique" fosse dizer Jornalismo. Foi nesse contexto que meu amigo Adriano Gaieski, companheiro inseparável dos papos literários e da boemia, apareceu inesperadamente na porta da minha sala de aula, no prédio 7 da Famecos.
— Volta, pega as tuas coisas, que vamos sair. Depois te explico — disse ele.
Curioso, segui-o. Nos corredores, a caminho do estacionamento onde estava uma Kombi do jornal, ele me explicou:
— Recebi uma proposta para trabalhar na Folha da Tarde, da Caldas Júnior, e preciso indicar, ainda hoje, um substituto para a minha vaga no Diário de Notícias. Pensei em ti.
Eu, recém-ingresso na faculdade, desempregado e inexperiente, não podia recusar a oportunidade. No caminho até a Avenida São Pedro, ele me explicou que eu seria setorista esportivo. Fiquei em pânico. Em três meses de Porto Alegre, nem sequer havia visitado um estádio por curiosidade.
— Azar! Nem eu era ligado em esporte. É fácil! — disse ele, tentando me tranquilizar. — Você passa a tarde no Olímpico ou no Beira-Rio, acompanha os treinamentos com o fotógrafo e, às 6 horas, já na redação, ouve a resenha esportiva na Guaíba e na Gaúcha. Depois, escreve uma ou duas laudas para cada um dos times da dupla Gre-Nal.
Meu pânico aumentou. Sempre fui apaixonado por artes e cinema, dedicando-me a assistir aos clássicos italianos de Fellini e ao impressionante cinema francês. Mas precisava trabalhar. Aceitei o desafio e, naquela mesma noite, fiz uma entrevista com o editor Jorge Mendes, um baixinho simpático que se tornaria meu amigo. Ele me deu três dias de teste. Não recebi uma resposta formal, mas fui ficando, até que o jornal fechou no final de 1978.
Nesse período, tive um apoio fundamental: um jornalista veterano chamado Adroaldo Guerra, com quem conversava diariamente às 9 horas da noite. Ele tinha uma voz pausada e sonora e me passava uma síntese do que ouvira ou soubera sobre a dupla Gre-Nal. Nunca o conheci pessoalmente, apesar de falarmos todos os dias. Às vezes, combinávamos um encontro, mas nunca surgiu a oportunidade.
Adriano Gaieski e Adroaldo Guerra foram essenciais na minha estreia no jornalismo. Ambos já partiram, mas deixaram lembranças que guardo com imensa gratidão.