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Uma destruição irreversível…

Uma matéria jornalística dos anos 70

24/09/2024 às 19h16
Por: Jalmo Fornari
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Uma destruição irreversível…

O ano era 1977. Eu, adolescente, recém-ingresso no curso de jornalismo da PUC, consumidor dos cadernos de sábado do velho “Correião”, leitor do Pasquim, fã de Chico e discípulo de Vinicius de Moraes, assíduo escritor de poemas inéditos e jamais publicados, sonhava em publicar alguma coisa em algum lugar. Afinal, eu estava me preparando para ser jornalista e precisava de público.

Meu amigo Claudio Thomas vivia a mesma ansiedade juvenil. Certo dia, quando discutíamos o futuro do mundo, algo que fazia parte da agenda dos jovens naqueles tempos, Claudio me revelou que uma jornalista de sua terra, Santa Cruz do Sul, tinha um jornal e estava propenso a publicar matérias dele e de algum colega de faculdade que estivesse disposto a escrever. Na verdade, da faculdade, mal tínhamos passado no trote dos “bixos”, onde eu, numa profecia “nostradâmica”, recebi a faixa de tartaruga no átrio do prédio “7” da Famecos.

O convite para escrever uma matéria foi o máximo. A dúvida era: escrever sobre o quê? Lembrei que havia lido alguns dias antes uma impressionante entrevista com José Lutzenberger realizada pelo COOJORNAL, uma publicação da efêmera Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre. Ele era, agrônomo, escritor, professor e um guru de um pequena parte dos jovens acadêmicos de então. Era, para a maioria um alarmista do meio ambiente numa época que sequer se utilizava o termo ecologista.

No entanto, na entrevista que de fato me tocou e impressionou, o grande visionário das mazelas ambientais que hoje vivemos vaticinava que o desmatamento indiscriminado nas nascentes e nas margens de córregos e rios nos levaria a uma situação de enchentes desproporcionais e secas absurdas em algumas regiões. O professor insistia que a falta de vegetação provocaria o assoreamento dos rios, causando vazões descontroladas durante as cheias, provocando enchentes como as que vivemos em maio deste ano. Lembro que ele descrevia também um aumento de terra nas águas de rios importantes como o Uruguai, citando um estudo que relatava o aumento progressivo de gramas por litros de agua.

A matéria, que acenava por um futuro pouco alentador, era uma profecia que fatalmente acabou se realizando. Sendo assim, o texto que escrevi se atinha a alguns tópicos da entrevista e mantinha a pretensão de ser um alerta aos leitores que porventura fossem atingidos pela publicação na região de Santa Cruz. O título, feito numa época em que eu era apenas um aprendiz de feiticeiro, era: “Ambiente Natural, uma destruição irreversível”. Claro que soava como uma previsão de estudante impressionado pela clarividência de um dos maiores defensores do meio ambiente que o Brasil conheceu.

O jornal era semanal e, como o texto era enviado por correio na época, acabou sendo impresso duas semanas depois e levou quase mais uma para chegar às minhas mãos em Porto Alegre. Confesso que fiquei um pouco desapontado ao ver que imprimiram o texto como eu enviei, sem correções, algumas necessárias no trabalho de foca, mas o jornal, que era impresso em papel branco e não nas tradicionais folhas de papel jornal, acabou sendo um registro da minha estreia, já inconformada com os destinos do planeta.

Dias depois, o CAAP, Centro Acadêmico Alberto Pasqualini, fez uma publicação interna de um jornalzinho formato revista, e lá estava eu escalado em um artigo de aprendiz. Desta vez era sobre o MPB4, um grupo que fazia um enorme sucesso na Música Popular Brasileira, com o “long play” Cicatrizes e músicas como “Pesadelo” . Algumas semanas depois, me julgava redator, -hoje reconheceria as enormes limitações-, acabei ingressando no jornal Diário de Notícias levado pelas mãos do meu amigo e irmão Adriano Gayeski. Ele me colocou em sua vaga quando saiu do “diarinho” para assumir um espaço na Folha da Manhã da Caldas Júnior. Eu me transformaria em repórter de esportes no jornal em que aprendi a ler quando morava na pequena Tenente Portela.

Por anos havia esquecido daquela primeira matéria, da entrevista com o Lutzenberger, das previsões que infelizmente se concretizaram. Com saudosismo, hoje recordo que estreei falando de um assunto que pouca gente dava importância e que a grande maioria considerava um alarme exagerado de um professor maluco seguido por jovens esquerdistas. Infelizmente, quase meio século depois, revirando maus guardados carcomidos e roídos pelas traças, encontro o jornalzinho que marcou a minha estreia e leio um assunto que parece que foi escrito ontem.

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Jalmo Fornari
Sobre o blog/coluna
Jalmo Fornari é diretor-proprietário do Sistema Província de Comunicação. Jornalista já atuou nos principais veículo de comunicação do Rio Grande do Sul, como as rádios Gaúcha e Guaíba. Também é advogado com pós graduação em direito previdenciário. Como político foi vereador em Tenente Portela por diversos mandatos, tendo ocupado por diversos momentos o cargo de prefeito. Nesta coluna você acompanha crônicas, textos e memórias.
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